Mecenas já não é sinónimo de milionário
Basta contribuir com um euro para ajudar a lançar um livro, um filme ou até uma startup. O poder está no crowdfunding, ou seja, no financiamento coletivo a um projeto.
Desde o cinema até às campanhas políticas, as iniciativas que podem ser financiadas através do crowdfunding passam também por atividades como o jornalismo ou a “caça aos tornados”. O público doa dinheiro para projetos que admira e decide quais devem transpor o papel para chegar à realidade.
O crowdfunding ganhou e continua a ganhar terreno, com o Banco Mundial a prever que o financiamento coletivo mobilizará um mínimo de 70 milhões de euros em 2025.
As dificuldades de acesso ao crédito bancário, que surgiram pós-crise de 2008, criaram problemas ao financiamento dos empreendedores. Para contornar a situação e como complemento aos meios de financiamento tradicionais, expandiram-se formas alternativas de economia partilhada. O micro mecenato explodiu e já movimenta milhões.
Segundo a legislação que regulamenta o crowdfunding em Portugal, este pode ser definido como o “financiamento colaborativo” de empresas, projetos ou atividades, através do registo em plataformas eletrónicas, a partir das quais se procede à angariação de parcelas de investimento provenientes de um ou vários investidores individuais.
O apoio a projetos através do financiamento coletivo na Internet é muito popular nos EUA, mas em Portugal os resultados ainda ficam muitas vezes longe das expectativas.
“O crowdfunding serve algo físico (livros, discos, filmes, etc). No caso dos eventos (e aqui falo de Portugal) não têm a adesão esperada”, sublinha Mário Dorminsky, um dos fundadores e diretores do Fantasporto, cuja 37ª edição decorre de 24 de fevereiro a 4 de março de 2017, no Teatro Municipal Rivoli, no Porto.
Em 2015, a equipa do Fantasporto organizou uma campanha de crowdfunding, que não se voltou a repetir porque os valores angariados foram insuficientes face ao objetivo esperado. «O crowdfunding é algo confuso para a lógica dos portugueses (eu diria dos europeus). Os maiores apoios estão a chegar do estrangeiro», considerava na época Mário Dorminsky.
O fundador salientava também que uma campanha de financiamento coletivo através da Internet nunca se poderia substituir ao trabalho de angariar patrocínios públicos ou privados para um festival internacional de cinema como o Fantasporto, sendo que alguns apoios já estão garantidos até 2017.
«O Fantas sempre se suportou», devido aos apoios privados, por regra cerca de 70 por cento em comparação com os públicos, garantia.
Atualmente o crowdfunding está a ser encarado com menos desconfiança do que em 2015, considera em nova entrevista Mário Dorminsky mas “tem que ser bem estruturado e apesar de alguns êxitos de empresas portuguesas é no Kickstarter (Europa, dado que é muito difícil entrar no dos Estados Unidos) que tudo acontece”.
À escala mundial o Kickstarter é uma das plataformas mais conhecidas de crowdfunding. Em Portugal a PPL é uma das mais conhecidas. Yoann Nesme, um dos co-fundadores, estima que os sites de financiamento colaborativo já angariaram desde 2011 em Portugal mais de um milhão de euros.
O jornalista Tiago Carrasco, o fotógrafo João Henriques e o repórter de imagem João Fontes, socorreram-se do Ifundnews, uma plataforma portuguesa de jornalismo financiada pelos leitores, para colocar em marcha uma campanha de crowdfunding, que teve um final feliz com a angariação do limite de dinheiro estabelecido, para realizar um documentário sobre as aventuras que viveram na viagem, de jipe, de Lisboa até à África do Sul. Leia a história completa no artigo Crowdfunding: Aventuras em África transformadas em documentário
Quando era candidato à Câmara Municipal de Lisboa, o atual primeiro-ministro António Costa recorreu à PPL, concretizando a primeira ação de crowdfunding a nível político de toda a Europa. O socialista pediu 3.500 euros para realizar «um vídeo dirigido a estimular os jovens a participar no próximo ato eleitoral» e ultrapassou em 88 euros este valor.
Todas as plataformas de crowdfunding agregam projetos com o objetivo de conseguir apoio junto da população, em vez de depender de um intermediário financeiro. Esta é a maneira dos empreendedores obterem uma maior credibilidade e transmitir segurança a quem vai financiar. Os portugueses ainda desconfiam dos pagamentos online e alguns revelam inseguranças quanto ao destino do dinheiro, indicam vários estudos.
Na maioria das situações, o doador em vez de obter capital, recebe uma recompensa como o livro ou disco que apoiou. A ajuda pode também ser realizada sem qualquer contrapartida, apenas com o objetivo de contribuir para a concretização da obra.
No crowdfunding existem igualmente casos em que se investe num projeto com o objetivo de obter uma futura participação no capital social, distribuição de dividendos ou partilha de lucros. Existe também outra hipótese em que a entidade financiada remunera o investimento através do pagamento de juros definidos no momento da angariação.
Se no prazo estabelecido conseguirem atingir o montante pretendido, os projectos recebem o financiamento. Se tal não acontecer quem investiu receberá o dinheiro de volta.
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